terça-feira, setembro 11, 2007

Notícia

EXPOSIÇÃO EM NOVA YORK RECORDA DETALHES DO 11/9


Não é a memória que está em jogo. É a celebração. A memória, pelo menos por enquanto, está facilmente ao alcance. Mas a celebração é assunto completamente diferente. A nova exposição da Sociedade Histórica de Nova York, por exemplo, não serve como celebração. "Here's New York: Remembering 9/11", que abre hoje, tem por tema exclusivamente a recordação - o que de maneira alguma reduz seu poder.

Em duas galerias, 1,5 mil fotos tiradas seis anos atrás durante aqueles dias apocalípticos por câmeras digitais e impressas a jato de tinta estão expostas, presas aos painéis por simples clipes de papel. Elas servem para despertar lembranças de pontos de pressão ocultos, sensações que suprimimos.

As imagens servirão para estimular a memória de qualquer morador de Nova York que tenha sentido o cheiro daquela poeira branca, visto os pedaços de papel chamuscado flutuando ao vento, perdido pessoas queridas ou que ainda porte as dolorosas cicatrizes físicas e mentais do ataque.

É preciso forçar os olhos a contemplar deliberadamente todas essas imagens. Elas estão montadas em sete fileiras, em cada painel, e pendem de cabos que atravessam cada galeria. Não estão organizadas por tema, cronologia ou autor. O impacto é quase como uma forma de bombardeio, uma acumulação percussiva de sensação, como se a quantidade deixasse marca tão forte quanto a qualidade.

As fotos, apresentadas sem títulos, créditos ou data, são trabalho de 790 colaboradores e variam de amadoras a profissionais, de composições claramente posadas a instantâneos frenéticos registrados em um momento no qual era preciso manter a histeria sob controle. Esse período provavelmente representa os dias mais fotografados da História. Será que alguém que dispusesse de uma câmera não tentou capturar algum dos momentos, contemplando a cena com descrença, raiva ou pesar?

Assim, as imagens agora se agrupam em categorias familiares: o alumínio derretido formando uma sombria paisagem lunar; o aço retorcido e as nuvens de poeira; a camada de poeira branca depositada sobre os automóveis e as figuras humanas em fuga; os santuários improvisados com flores, velas e cartazes; os cartazes de busca de desaparecidos; os depoimentos em honra dos bombeiros e policiais; os rostos marcados pelo choque e pelas lágrimas; e por fim os memoriais de celebração dos serviços uniformizados.

Essas imagens, vistas pela última vez em Nova York em 2002, foram recolhidas inicialmente para uma exposição quase improvisada, realizada nos dias que se seguiram ao 11 de Setembro na Prince Street, em SoHo, onde Michael Shulan, Charles Traub, Gilles Peress e Alice Rose George começaram a mostrar fotos dos acontecimentos, solicitando que os visitantes contribuíssem com suas imagens, em uma exposição que ganhou o título "Eis Nova York: Uma Democracia de Fotografias". (Informações sobre a exposição podem ser vistas em http://www.hereisnewyork.org).

Dezenas de milhares de pessoas viram a exposição antes que ela saísse em viagem por outros países. Na época, as fotos foram reproduzidas e vendidas para levantar dinheiro para uma das sociedades de caridade relacionadas ao 11 de Setembro. Os criadores da exposição posteriormente doaram seus originais à Sociedade Histórica. Um livro com as fotos da exposição foi publicado, e também está em exposição no local.

Montadas em folhas soltas, sem ordem definida ou rótulos de identificação, as fotos espelham o impacto da experiência imediata. Mas seu efeito aqui é equiparado por uma seleção dos cerca de 500 vídeos realizados pelos colaboradores da exposição "Here is New York" - lembranças de sobreviventes, espectadores, trabalhadores de resgate - exibidos durante a exposição em forma de loop de vídeo.

"Você precisa da minha ajuda, querida", uma mulher recorda ter ouvido de um policial, na escadaria do World Trade Center, depois que ela instou que ele ajudasse outras vítimas. Ele o fez, mas não sobreviveu. A força da atual exposição está no poder dessas memórias e nos vislumbres fotográficos do tempo nos quais o impensável permanece congelado. Para mim, as fotos e vídeos ressoam muito mais do que os artefatos que a sociedade tem em exposição.

Ver um fragmento do trem de aterrissagem de um dos aviões, ou um fragmento enferrujado de uma das vigas de sustentação do World Trade Center, ou até mesmo um relógio de mesa esmagado e quebrado, com os ponteiros parados marcando as 9h04min daquela manhã - os objetos como esses precisam ser identificados e interpretados para que façam diferença. Estão expostos aqui porque são relíquias dos acontecimentos, oferecendo uma conexão direta ao passado; mas precisamos manter essa conexão em mente, e pensar de novo em tudo mais que esteve envolvido, a fim de lhes conferir significado emocional mais profundo.

Trata-se de um dos limites da simples memória; ela permanece como sensação ou desaparece como sensação. Mas isso é o que a celebração deveria transcender. Celebração propicia interpretação, oferece um significado público que sobrevive ao acontecimento. Ultrapassa a experiência privada e continua a oferecer significado mesmo depois que a memória desaparece. A celebração não é questão de cura ou sensação; é questão de significado.

O problema é que nenhum outro acontecimento que me ocorra se provou tão resistente à celebração pública de suas vítimas. O histórico quanto a isso é lastimável. O local do ataque continua a ser um pomo da discórdia, disputado por grupos de interesses rivais. E há disputas também sobre o memorial planejado para o Liberty State Park, em Nova Jersey.

Como demonstram as fotos da exposição, ver o 11 de Setembro como ataque injustificado sempre causa desconforto. Poucas horas depois da "tragédia", muita gente já parecia preferir se culpar. A relutância em ver o ataque apenas como agressão, e os problemas que continuamos a ter sobre como combater o terror islâmico, são motivos para que, passados seis anos, tenhamos tantas memórias mas ainda não saibamos como celebrar a memória das vítimas.

Edward Rothstein - Tradução: Paulo Eduardo Migliacci ME



The New York Times